segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

A eternidade na palma da mão

Mil viagens  fizesse, mil vezes que repetisse: "Passado é passado e o que conta é o aqui e agora", o passado manhoso pendurava-se sem pudor nos seus ombros e fazia com que o seu peso transformasse as coisas mais fáceis de fazer em torturas que lhe tiravam a sono.Nunca conquistara a sua liberdade de forma positiva tudo o que conseguira era ir contra-corrente num medo persistente de cair da falésia que tanto a atraía e ao mesmo tempo a repugnava...porque a falésia da sua vida espraiava-se até ao infinito e parecia chamá-la insistentemente, o que é que a podia impedir de mergulhar no azul sem fim e desaparecer? O seu desdém pela raça humana colocou-a numa posição de dúvida sobre todos os valores que formataram o seu pensamento até uma certa idade. Ela duvidava de tudo, de todos e até dos seus próprios sentidos e emoções.Ela sabia que carregava com ela o fardo da eternidade até que a hora de fechar os olhos chegasse. A sua eternidade era aquele ponto pequenino que algures no passado a alienou, transformando-a numa garota fria, calculista, sem remorsos nem valores morais.Só uma certeza a mantinha humana, demasiado humana: ela tinha uma família numerosa que apesar de tudo devia amá-la; apesar das suas ausências, dos seus silêncios e das suas fugas.
Tudo o que tentou empreender não lhe trouxe a felicidade a que todas as almas aspiram. Era uma diletante da vida e gostava paradoxalmente de enaltecer paixões proibidas. Gostava de amar as coisas sem compromissos, amava quando nada lhe pediam, apaixonava-se sem se preocupar com o amanhã porque o processo da sua construção mental não obedeceu às regras de uma educação cuidada, onde imperasse o carinho, a sede do conhecer e do auto-conhecimento, a importância do saber como libertação de uma tradição judaico-cristã que empurra a felicidade para o além, condena-nos a uma existência de auto flagelação. Para chegar ao SABER  Ariana tinha que transpor a barreira da tradição pois "para ser mulher bastava ter filhos e ser obediente" dizia-lhe o pai. Ter filhos ainda vá que não vá, mas ser obediente? Hum... seria difícil, depois de saborear a libertação que proporciona o conhecimento, amarrar-se a regras que não fossem as suas próprias regras.

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