terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Mão que mata coração que chora

" Alecrim, alecrim aos molhos
Por causa de ti
choram os meus olhos!"
A canção trouxe-lhe de volta o aroma forte que o envolveu quando o abraço do seu pai se prolongou e por segundos cristalizou o ontem e o agora numa relação sem futuro; foi envolto no mesmo perfume de Verão que Jaime se despediu de Ariana sob o frondoso pinheiro que seria testemunho mudo do fim da inocente visão sobre o mundo. Jaime não sabia que ao entregar a sua menina aos "avós" vindos de paragens onde se podia trocar a  virgindade de uma menina por uma garrafa de álcool, estava a abrir-lhe um universo de possíveis feridas morais. Eram costumes exóticos que ligavam os colonos brancos aos nativos, mostrando os primeiros um total desprezo pela dignidade das mulheres e crianças e os segundos uma certa degeneração dos laços familiares, por isso o Velho trazia na sua bagagem de colono o hábito infringir todas as regras.
No fundo os colonos eram o garante da supremacia do império, eles representavam nas colónias portuguesas o ideário Salazarista que seguia um padrão paternalista e conservador, que defendia e promovia o trabalho forçado do negro mas ao mesmo tempo adaptava-se aos costumes indígenas de forma mórbida e imoral.
Se para um negro o sistema de trocas era normal, trocar uma jovem por uma certa quantidade de vício nada tinha de comprometedor: era uma mera troca comercial. Para o colono era mais do que isso pois ia contra todos os usos e costumes do bom povo português que matava com as mãos enquanto chorava com o coração e os olhos virados para Deus. O Velho-do- Chapéu, nestas paragens , cavalgava como cavalo à solta com o cio da primavera.

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