quinta-feira, 15 de julho de 2010

Como será a verdadeira viagem? O primeiro e o último passo que damos abrem ou fecham-nos para sempre as portas da serenidade.



A família esperava, impaciente, a chegada à pequena estação bem cuidada, após uma longa viagem de comboio, sufocante e maçadora.
Jaime olhava através das vidraças, a paisagem verde e cinzenta, tão querida e distante ao mesmo tempo. Terna memória dos tempos de infância, bucólica e dramática. Tempos duros de uma tenra vida sulcada pelo trabalho e comoventes eventos.
Os pinheiros altivos, de um verde triste, estalavam sob o sol escaldante e formavam manchas que salpicavam a penedia. Uma viagem organizada, pelo norte de Portugal, tinha suscitado a oportunidade, tão esperada e adiada ao mesmo tempo, para Jaime levar a sua descendência a conhecer a aldeia natal, onde mais tarde, a camioneta da excursão, os viria buscar. Esta viagem iria transformar-se numa viagem às origens. Uma jornada de purificação das lembranças já ténues, por vezes desconfortáveis, mas sempre revigorantes.
Na estação de Santa Apolónia, em Lisboa, a família Veríssimo (o pai, a mãe e os seus dois rebentos) pouco habituada aos ares das serranias, tinha iniciado uma viagem de baptismo, rumo a Alpedrinha, num comboio fumarento e desconfortável com os seus bancos de pau. A viagem seria muito longa, mas Jaime estremecia de alegre euforia e de apreensiva expectativa à medida que a velha locomotiva se embrenhava nos montes. Avançava suando e deixando escapar silvos estridentes, através dos campos ondulados onde o homem mostrava toda a sua habilidade ao aproveitar todos os palmos de terra que a serra sempre agreste mas generosa oferecia humilde e altiva ao mesmo tempo àqueles que se aventuravam a desbravá-la.
Como iria encontrar os lugares da infância, percorridos vezes sem conta pela imaginação de homem feito?
Tinha chegado à conclusão que não poderia continuar em frente com a sua vida, mantendo-se de costas voltadas para o passado. O presente não teria todo o sentido se não fizesse as pazes com a memória. Para isso ali estava ele , de pé, espreguiçando o olhar através das vidraças do comboio, como se quisesse fixar para sempre aqueles momentos fugazes do reencontro com os campos que, sob o Estio, estremeciam e faziam vibrar o ar em colunas de vapor.

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